sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

Fechando a ferida


Fechando a ferida

Logo, logo, tudo isso vai acabar. Fecho os olhos e sinto o sangue quente corando meu rosto, percorrendo rapidamente meus vasos; enxergo ora vermelho-intenso, ora vermelho-suave, conforme o ritmo acelerado do meu coração. Nesse instante, sinto a raiva me consumindo e percorrendo todo meu corpo, ela cerra meus punhos e me causa um impulso destrutivo que luto pra conter. Procuro me acalmar, afinal sei que tudo vai passar.

Concentro-me na areia que escorre lentamente pela ampulheta e percebo que a maioria dela já atingiu a porção inferior, não nos resta muito tempo. Aos poucos minha raiva vai passando e cedendo lugar à tristeza, abro os olhos e eles estão completamente úmidos. Sinto vontade de chorar, mas me seguro pra não te dar esse prazer. Já basta sua incrível habilidade em me machucar com palavras e cutucar aquela ferida que resguardo num lugar onde apenas nós dois temos acesso.

Você faz da guerra uma arte e eu tento transformar em arte o meu sofrimento, mas não sou tão habilidoso quanto você. Respiro fundo, prendo as lágrimas e dirijo minha atenção à ampulheta: o tempo está passando e o que estamos construindo? Vejo entre nós dois um rio de mágoas no qual costumo me afogar. Da minha parte me empenho em construir uma nave enquanto você seleciona as pedras mais afiadas para me atingir. Depois que agride me aluga os ouvidos com discursos vazios que não me iludem mais, tampouco me enchem de esperança.

Sei que vou voar, logo, logo, vou voar. Sofro enquanto você senta na poltrona e lê o jornal como se nada estivesse acontecendo. Fecho os olhos e vejo que tudo está acabando. Sei que quando abri-los novamente tudo será diferente, cada qual terá o que cativou e de nós dois restará apenas o dito pelo não-dito, as dores bem guardadas e resolvidas por cada um a seu gosto. Quando enfim o dia chegar, irei embora aliviado levando na lembrança somente o pouco que te pedi - bem pouco - e deixarei contigo as angústias que não resolvemos. Faça delas o que você achar melhor.

[Mente Hiperativa]

2 comentários:

  1. Tive a impressão de sentir suavidade e intensidade ao mesmo tempo. Não sei bem se suavidade é a palavra certa. Mas sabe aquelas cenas de filme em que tudo está agitado lá fora, mas o personagem foco da cena está parado em meio aos flashs de movimento. Like that.

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    1. Ótima analogia! Como se houvesse um foco em meio ao caos... :D

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