sábado, 23 de fevereiro de 2013

Reclame menos, aja mais!



Reclame menos, aja mais!

Pare de reclamar sem fazer nada. Abandone o conforto da sua poltrona, largue mão do ambiente calmo e climatizado em que se encontra nesse momento, deixe de lado essa coca-cola gelada, desligue a televisão – essa fonte inesgotável de lixo e estupidez – e encare os seus problemas de frente. Mude o mundo, ou pelo menos faça sua parte e dê a ele condições para que possa mudar. Quebre suas convicções em mil pedaços, destrua tudo aquilo que te inquieta e te faz mal. Reconheça sua parte de culpa, se esforce pra acabar com tudo aquilo que lhe confere esse péssimo ar mal-humorado, facilmente observável em cada uma de suas linhas de expressão.

Não espere que o mundo vá mudar sozinho numa única e grande revolução, muito menos que essa reviravolta ocorrerá de forma alheia ao seu esforço. A paz não cairá do céu como caem as grandes chuvas, pois tempestades são compostas de inúmeras e pequenas gotinhas de água que se somam até atingir enorme dimensão. Sendo assim, para provocar uma grande revolução precisarás de inúmeras pequenas atitudes, exercitadas diariamente e de forma disciplinada. Esse é o segredo.

Sendo assim, encare o fato de que suas palavras de reprovação e desgosto jamais poderão alterar o rumo das coisas, discurso sem ação nunca terá o poder de reconfigurar a realidade. Levante-se e vá à luta, se entregue às dificuldades e sinta na pele a dor daquilo que lhe incomoda. Faça alguma coisa, a vida não tem controle remoto para que permaneças aí sentado a reclamar e reclamar, esperando que as coisas mudem por si só. É preciso deixar de alimentar ciclos viciosos que nos impedem de crescer. Rompa com eles, mude de postura, enfrente as situações com sabedoria e bravura, dê a cara à tapa.

Primeiro reconheça os padrões repetitivos que te colocam estagnado nesse desconfortável local onde você se encontra agora. Investigue o que te leva a ficar preso e imóvel. Em seguida enumere uma série de posturas que poderão te tirar dessa, crie planos, metas e sobretudo coloque-os em prática. Se diante de determinada problema você cala, grite; se costuma gritar, então cale. Nunca teremos novos resultados usando os mesmos métodos. E se os fins não foram satisfatórios não hesite em tentar uma abordagem diferente. Faça o que for, só não fique esperado que o universo conspire a seu favor sem que você empenhe o menor esforço.

[Mente Hiperativa]

Provações



Provações

Sorrir, apesar da tristeza
Lutar, apesar da dificuldade
Amar, apesar da dor
Insistir, apesar do desprezo
Continuar, devido à fé

[Mente Hiperativa]

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Eu amo outro homem


Eu amo outro homem


Determinado dia um amigo chegou para o grupo e disse: “quero dormir com dois homens”. Todos ficaram perplexos, abismados, nunca imaginaram ouvir tais palavras saindo da boca dele, logo da boca DELE. Ninguém sabia exatamente o que fazer, alguns riram, outros caçoaram, a maioria recebeu a declaração com imenso espanto. Eu encarei com naturalidade, afinal sabia que ele tinha dois filhos e imediatamente deduzi que podiam ser eles os homens referidos na conversa; não concebi a ideia com olhos maldosos e inquisidores como os outros

E logo em seguida, o amigo confirmou minha suspeita ao confessar que os homens em questão eram de fato seus dois filhos, levando todos a caírem na gargalhada, completamente desarmados diante de tão natural e incondenável declaração de amor. E se não fossem os filhos, mas outros dois homens quaisquer, teria ele o direito de amar e expressar esse amor? Homens podem se amar?

Infelizmente a questão do amor masculino ainda é bastante negligenciada por todos nós, os homens aprendem desde cedo que não podem chorar, são treinados exaustivamente para não evidenciar suas fraquezas, recebem cobranças exageradas para que sejam sempre fortes, imponentes, brutos e racionais. Também não lhes dão o direito de poder amar ou extravasar seu amor por outro homem, ainda que seja um familiar ou amigo de infância, pode ser até um desconhecido que acabou de salvar-lhe a vida, mas o homem é orientado a nunca dizer que o ama ou será eterno motivo de piada.

Então, esses são os valores que a sociedade nos impõe, porém o amor não reconhece qualquer um desses impedimentos e pulsa dentro de nós a todo instante, ignorando qualquer empecilho para sua realização. O amor é inerente ao gênero e no caso específico de dois homens ele acaba por se disfarçar através da atenção, chamadas telefônicas, abraços tímidos e distanciados, apertos de mão firmes e sustentos. Até mesmo um convite pra beber e colocar o papo em dia pode ser uma forma discreta e socialmente aceita de um homem dizer pra outro “gosto de você, sua companhia é boa pra mim” ou “preciso de você por perto, meu amigo, te amo”.

Dificilmente o amor entre homens se fará através de declarações mais ousadas e intensas, evitamos a todo custo mostrar explicitamente nosso amor por receio de gerar algum desconforto ou má-interpretação de nossa virilidade. Temos medo de infringir as regras aprendidas logo na infância – que a essa altura já se encontram solidificadas em nossas mentes – e então sufocamos o ‘eu te amo’ fingindo que apenas gostamos do outro homem como quem gosta de um copo de cerveja ou de um vídeo game de última geração. Encaramos como algo natural e morno que não precisa ser admitido ou negado, o amor entre homens é sempre desconversado.

Isso tudo acontece pelo simples fato de que o ‘eu te amo’ dirigido a outro homem nos coloca numa situação complicada de ter que negar tudo que foi aprendido desde a infância e reforçado ao longo da vida. Além disso, muitas vezes essa declaração pode lhe render algum questionamento de gênero ou até conduta sexual, o que é algo completamente descabido. O amor fraterno, puro e inocente não reconhece qualquer impedimento para se manifestar, nós é que por pura insegurança ponderamos e ajustamos socialmente as proporções evidentes que esse sentimento pode atingir diante dos olhares da sociedade. Em outras palavras, sentimos o amor dentro de nós, no entanto temos o devido cuidado para que ele não pareça destoante do pensamento da maioria.

Diante disso tudo afirmo sem medo algum que amo outro homem. Aliás, amo vários homens. Inclusive todas as noites eu durmo com outro homem no meu quarto, meu irmão mais velho. Há outro homem com o qual faço sexo casual e todo dia lhe digo as seguintes palavras “eu te amo, seu gostoso”, esse homem sou eu mesmo e as declarações faço diante do espelho toda manhã. Tem outro homem que vem passar os fins de semana comigo, faço comida pra ele, dou-lhe banho, coloco-o pra dormir, faço carinho e encho-o de beijo, é o meu irmão caçula. Além desses, há tantos outros homens que fazem parte da minha história, me presenteiam com momentos de companhia, conversa e apoio, são meus amigos que tanto amo e não tenho problema algum em apertar suas mãos com firmeza ou abraçá-los.

Acredito que meu amigo tenha sido bastante perspicaz ao desafiar os outros com sua declaração de que gostaria de dormir com dois homens sem dizer de imediato que seriam eles os seus dois filhos. Sem dúvida alguma ele foi inteligente e soube aguçar a imaginação alheia, causando-lhes um espanto desmedido. Homens também amam, choram, sofrem por amor, se abraçam e manifestam sentimentos. O amor entre homens é assim, cheio de mitos e ao mesmo tempo tão simples. Tenho a consciência de que o amor é o único caminho que Deus nos ensinou pra alcançá-lo e ele não é feio, sujo ou vedado aos homens. Sendo assim, não precisamos ter vergonha de amar, pois o homem que ama outro homem ama a si mesmo. Eu amo outros homens, eu me amo, e isso não é problema pra quem tem consciência e segurança de sua masculinidade.

[Mente Hiperativa]

domingo, 17 de fevereiro de 2013

A bênção do mar



A bênção do mar
O dia havia sido bastante difícil, repleto de problemas e más-notícias. Sendo assim, tentei fazer algo que me trouxesse um pouco de prazer em meio a tantas mazelas, precisava arejar as idéias e amenizar a dureza da vida. Senti necessidade de me sintonizar com alguma fonte de energia positiva e nada melhor que o vento salgado do mar, sua imensidão azul, pra confortar e encher de paz a minha alma perturbada. Era fim de tarde, o sol se punha de modo que seus raios oblíquos cruzavam os prédios enormes enfileirados à beira-mar, permitindo a formação de uma cortina de luz a qual tocava levemente a areia fina da praia. Preguiçosamente ele se escondia ao mesmo tempo em que enchia o céu de tons amarelos e alaranjados, criando assim uma pintura impressionista que tornava meu passeio ainda mais relaxante.

Atravessei rapidamente a avenida que divide o paredão de prédios e a praia, sem qualquer cerimônia fui logo tirando os chinelos dos pés pra poder apreciar os farelos de areia entrando por entre os dedos, também queria sentir a textura dos sargaços roxos e verdes que morriam encharcados na areia formando verdadeiros tapetes naturais tão gostosos de pisar. Havia alguns poucos siris mortos no meio das algas, o que juntava muitas moscas daquelas bem miúdas que só se vê em praia mesmo. Saí tateando com os pés cada concha que surgia pelo caminho, também as pedras, tocos de madeira e restos de corais que as ondas resgatavam do fundo do mar, queria me apropriar de cada centímetro daquela praia como se estivesse fazendo uma leitura em braile com os pés. Caravelas minúsculas e aparentemente inofensivas repousavam na areia, mortas ou quase mortas; e cada vez que encontrava uma delas o meu dedão insistia em estourá-las dando-lhes um certeiro golpe de misericórdia.

Avistei muitas pessoas pelo caminho, algumas passeavam sozinhas refletindo sobre a vida, outros cantavam canções em baixo tom, corriam, ou apenas contemplavam o espetáculo da natureza que era aquela bela paisagem incrustada no meio urbano. Eram raras as moças de biquíni àquela hora, também vi alguns casais abraçados ou de mãos dadas, outros permaneciam sentados na areia namorando timidamente. Estes ao certo esperavam que o sol fosse embora de vez para que pudessem se esconder melhor dos olhares famintos e moralistas. Diversas crianças corriam sabe-se lá pra onde, serelepes que são. Nem mesmo elas sabem pra onde querem ir, mas ainda assim correm e correm. Havia uma menina chamada Cíntia cuja mãe gritava aflita pelo seu nome. Cíntia corria distante, usava um maiô cor-de-rosa da hello kitty, segurava pá e balde nas mãos, mas quando ouviu as súplicas da mãe logo desacelerou o passo enquanto soltava uma gargalhada gostosa de ouvir. Seus cabelos eram longos e cacheados, aloirados, e dançavam no vento como dançavam as folhas dos coqueiros. Cíntia parecia ter três anos e ainda muita vida pela frente.

A certa altura da praia parei um pouco pra admirar o mar, se fosse fumante certamente essa seria a hora de sacar um cigarro, mas como não sou, traguei mesmo a brisa marítima. Aproveitei pra jogar na lixeira alguns palitos, tampas e cacos de vidro que havia catado pelo caminho e guardado no bolso. Em seguida, sentei pouco mais adiante na areia fofa e alva pra contemplar o azul, queria mergulhar nas águas do mar, mas preferi avaliá-las antes. Além disso, percebi algumas pessoas em volta e tive um pouco de vergonha. Havia uma senhora sentada a alguns metros atrás de mim num barco qualquer encalhado na areia e parecia me observar. Ela usava um longo vestido estampado, tinha claras feições indígenas e mantinha-se de braços cruzados, não sei se sentia frio ou se era pura indiferença.

Logo depois que sentei chegou também um senhor e parou a certa distância, parecia turista, um “gringo” como chamam. Ele ostentava um olhar sério e expressão envelhecida, era calvo e suas bochechas estavam bastante avermelhadas. O gringo tirou a camisa e pôs à mostra sua enorme barriga proeminente que quase encobria a sunga azul-marinho que usava. Largando a roupa no chão ele caminhou vagarosamente em direção ao mar e aos poucos foi se perdendo em sua imensidão. Dentro d’água ele parecia sentir-se em casa, nadava e fazia estripulias como um golfinho, parecia se deliciar na água morna e azulada daquele marzão tropical. Aproveitei o embalo e criei coragem pra entrar na água também.

Tirei a roupa e fiquei apenas de sunga, dobrei a camisa e a bermuda com cuidado e coloquei tudo no chão, em cima do meu chinelo. Com cautela me aproximei do mar, tão vasto, e fui penetrando aos poucos em seu domínio imprevisível. Pensei nos tubarões que poderiam surgir, mas quando aparecem é somente na região mais profunda, por isso me restringi a ficar na parte rasa. Apesar de jamais ter tido contato com um tubarão tenho muito medo deles, sobretudo de suas bocarras repleta de dentes afiados e pontiagudos prontos pra dilacerar minha carne. A água não estava muito agitada, no entanto as ondas me derrubaram algumas vezes e aproveitei pra dar alguns mergulhos.

Por sorte, ou excesso de cautela, não tive nenhum infeliz encontro com tubarões. Ainda dentro d’água, de vez em quando eu olhava em direção à areia apenas pra constatar que minhas roupas continuavam lá, visto que seria trágico se me levassem e eu tivesse que ir pra casa apenas trajando uma sunga listrada. A senhora que parecia uma índia permanecia sentada no barco encalhado como se esperasse alguém. Talvez só pensasse na vida. Próximo a ela pude observar uma placa que continha os seguintes dizeres: Perigo - área sujeita a ataque de tubarão / Danger – bathers in this área are at a greater than average risk of shark attack. Por via das dúvidas, e depois de ler essa mensagem de alerta, preferi voltar correndo pra terra firme e segura.

Rapidamente eu deixei as águas e sentei-me no chão sob o pretexto de esperar que o vento me secasse. Enquanto me coçava um pouco por conta do sal eu notei um casal próximo que me observava. A moça me pareceu um pouco familiar, no entanto não consegui reconhecer exatamente quem era e como não falou comigo preferi ficar quieto na minha. O rapaz que a acompanhava, provavelmente seu namorado, não aparentava gostar dos meus olhares a soslaio, porém seu olhar junto ao da moça também me incomodava.

Não demorei muito, me enxuguei com a camisa e me vesti, não queria demorar ali e o sol já estava indo embora, era hora de voltar pra casa. Sendo assim, tomei o percurso de volta. Andei pela praia observando atentamente cada detalhe do caminho. Encontrei um peixe da espécie baiacu ‘perdido’ na areia. A água do mar ia e vinha, mas não conseguia levá-lo de volta. Ele parecia um pouco inchado e seus espinhos intimidavam um contato mais próximo. No entanto, me aventurei a pegá-lo com cuidado, ele inchou ainda mais e quase me espeto com seus espinhos. Joguei-o na água um pouco mais adiante, não teve jeito, ele parecia incapaz de nadar e logo as ondas o trouxeram para a beira novamente. Ele tinha uma cor cinzenta tingida de bolas amarelas bem reluzentes. Era muito bonito, tinha a respiração ofegante e acho que estava morrendo. Fui embora sem poder intervir no destino dele, não pude fazer como fiz com as caravelas, tive que deixá-lo morrer lentamente.

Segui meu caminho num passo lento de quem não quer chegar no destino de casa e encontrei muitos jovens jogavam bola na areia da praia como se não houvesse nada pra fazer, nem trabalho, nem estudo, nem filhos ou outras preocupações. Mas pensando bem eles também merecem algum lazer e certamente qualquer problema ou responsabilidade poderia esperar um pouco enquanto se divertiam naquele fim de tarde. É interessante observar como o futebol tem essa capacidade de ocupar a mente e trabalhar o corpo, permitindo que uma simples bola traga tanta felicidade e ocupação. Todos se divertiam em meio a gritos, gargalhadas e rápidas passadas de bola, alguns poucos assistiam a partida sentados na areia. Havia um deitado e visivelmente cansado, talvez pouco acostumado ao exercício físico; outros o acompanhavam, possivelmente aguardando a vez de entrarem na partida.

Prossegui adiante, sempre me guiando pelos prédios altos e tão diversos, avistados por detrás dos montes de areia. Estava próximo de casa e o sol já estava distante, tão distante que seus raios não mais formavam mais aquela cortina de luz sobre a areia. Os postes de iluminação pública já haviam se acendido e a lua já ocupava seu trono no céu, embora as estrelas ainda estivessem apagadas. No calçadão pude avistar o enorme fluxo de pessoas caminhando e fazendo cooper, algumas bebiam água de coco no quiosque e a vida parecia fluir naturalmente como todo fim de tarde.

Atravessei a avenida novamente, dessa vez de encontro à fila indiana de prédios que se amontoam diante do mar. Gosto de analisar a arquitetura de cada um observando suas peculiaridades: alto, baixo, largo, estreito, moderno, clássico, arrojado, prático... São inúmeros prédios construídos em tempos diferentes, atendendo às mais variadas exigências de mercado, porém todos com o mesmo atrativo principal: são de frente para o mar. E foi por isso, salvo engano, que vim morar nessa parte da cidade, por conta do mar. Cheguei em casa, toquei o interfone da portaria do meu prédio e entrei assim que o portão abriu. Dei uma última olhada para o mar e por um instante lembrei o dia ruim que tive, mas tentei fazer algo que me acalmasse a mente ao mesmo tempo me trouxesse algum prazer. Sempre procuro o mar pra pensar na vida, mas nesse dia em específico foi o oposto que me levou até ele. Queria esquecer da vida.

[Mente Hiperativa]

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

Não me importa


Não me importa

Pouco me importa a mancha amarronzada de lama que tinge a barra da minha calça jeans azul-marinho. Nem o pedaço de mortadela de frango sadia que está há cerca de cinco dias em cima do balcão da cozinha, dentro de um tapaware mal tampado e já produzindo um forte odor de podre. Nada disso me incomoda. O telefone toca várias e várias vezes, ignorando o fato que não lhe dou a mínima atenção, sequer ensaio qualquer movimento em seu sentido. Até gostaria de sacudi-lo janela abaixo, porém o estado em que me encontro não permite que me levante para executar árdua tarefa. Sendo assim, permaneço estirado no chão como uma barata inebriada por uma boa dose de inseticida em aerosol.

Na minha sala a poeira já formou uma colônia debaixo do sofá cor-de-mostarda e criou uma espécie de tapete sobre as pranchas de madeira que sustentam velhos porta-retratos cujas fotografias estão bastante desatualizadas. As janelas permanecem fechadas, assim como as cortinas, e o calor já não me incomoda mais. E há tanto papel amassado e outros dejetos no meu lixeiro que já trasbordam pra fora e se alastram pelo chão atingindo quase a porta. Com boa dose de ironia que ainda me resta, fico a imaginar se conseguirão cruzar a porta e ir embora sozinhos. Também pouco me importa se vão ou se ficam, se atraem baratas ou simplesmente enfeiam o espaço que habito. Que ainda habito.

As roupas no varal completam aniversário, até aquela camisa com listras azuis, verdes e pretas que tanto gosto e que meu irmão sempre pediu emprestada mas nunca dei. Até mesmo ela está há semanas estendida, recebendo os afagos diários da brisa salgada do mar. No momento estou com preguiça de recolhê-las, minha única preocupação agora é conseguir abrir um pacote de bolacha maisena e comê-lo com margarina enquanto zapeio os canais da televisão, mesmo sabendo que nada, absolutamente nada, poderá despertar meu interesse. É uma pena que o aparelho de DVD esteja quebrado senão poderia assistir um filme. Além disso, a máquina de lavar roupa também está quebrada.

Talvez depois de comer algumas bolachas eu jogue o restante do pacote no chão ou coloque-o sobre a mesa de centro e descanse um sono ali mesmo estendido no chão frio, com a cabeça recostada sobre alguma das almofadas empoeiradas e de extremo mal gosto que ganhei de presente da minha tia no natal passado. Bem que eu gostaria de tê-las recusado no ato, mas preferi não cometer tamanha desfeita. Pois bem, preciso dormir, depois de um bom sono eu sei que tudo ficará melhor. É sempre assim, sempre exatamente assim.

Com um pouco de sorte e após uns trinta minutos de espera, minhas pálpebras começam a pesar e então percebo que o remédio já vem fazendo efeito, tento lutar, mas acabo me entregando ao sono reconfortante e quimicamente induzido. Na TV, a apresentadora do noticiário anuncia a previsão do tempo, que pouco me importa, faça chuva ou faça sol, não vai mudar a minha vida. A imagem começa a ficar embaçada, ouço alguma coisa sobre guerras ou crises mundiais, calamidade nacional, o som começa a ficar disforme, affaires dos famosos, recém-descoberta do papel medicinal da geléia real no tratamento do câncer, acho que foi essa a última notícia que consegui ouvir antes de apagar de vez.

Pouco me importa se foi geléia real, câncer de mama ou laringe, cavaleiro das trevas ou renúncia do papa. Qualquer coisa pra mim não faria diferença naquele momento, eu gostaria mesmo é que o mundo inteiro explodisse com uma bomba atômica ou um meteoro inesperado. Eu precisava apenas dormir pra não ter que digerir o imenso mal que me foi causado. Pouco me importaria se a raça humana fosse dizimada durante meu sono plácido, assim como acabaram com os dinossauros e eu nunca senti a menor falta deles. Já não ouvia o som da TV, mas ainda pude sentir o cheiro de presunto podre que vinha da cozinha. Ou seria mortadela? A essa altura eu já não sabia nem o nome da minha mãe, o número do meu RG, quanto mais o tipo de embutido que fedia em meio a tantos problemas na minha cabeça.

O mundo parecia o caos, minha vida também. Mas pouco me importa, afinal quando não se tem amor nada é capaz de nos abalar.

[Mente Hiperativa]

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Sobre a fragilidade das relações


Sobre a fragilidade das relações



Lembro daquele dia em que você se mostrou preocupado e admirado com o caos a que estão submetidas certas famílias que outrora se aparentavam tão organizadas e estruturadas, hoje se acabaram diante das dificuldades da vida. Famílias que mais pareciam castelos medievais, enormes e sólidos, que desabaram no chão como palafitas diante de uma simples tempestade. Percebo que você tem medo que sua realidade caia por terra como a delas caiu, e tens razão pra ter medo afinal sabes a fundação que tuas construções têm; aparentam ser de concreto, mas foram feitas de pura areia.

E tudo que não tem base sólida está sujeito a virar farelo. É apenas uma questão de tempo.

[Mente Hiperativa]

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

A indiferença como remédio



A indiferença como remédio

Em certos momentos da vida precisamos sufocar nossas palavras ainda que estejamos com a razão, o silêncio continua sendo a melhor resposta nessas situações. Há circunstâncias em que não vale a pena alimentar discussões sem sentido, disputar a razão ou o poder sobre a verdade; qualquer coisa, absolutamente qualquer uma, apenas servirá de combustível para que a briga se estenda e cause danos maiores a ambas as partes. Nesse sentido, calar é a melhor resposta. Ignore as súplicas de seu oponente que te provoca pra que você fale e alongue um mal-estar, complicando a vida de ambos. Dê o troco certo desobedecendo-o, ele deseja que você o agrida para que ele tenha a justificativa de também poder agredir você, mas não alimente suas expectativas de conflito, despreze-o. A indiferença muitas vezes é o melhor castigo. E a melhor vingança possível.

[Mente Hiperativa]

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Divagar



Divagar

Pensou que a felicidade seria fácil

Que o amor seria doce

E que a vida...

Ah, a vida

Sempre cheia de desafios!
[Mente Hiperativa]

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Quando o amor rima com a dor



Quando o amor rima com a dor
Carrego uma ferida bastante antiga que não consegue cicatriz por completo. Cada vez que se forma uma casquinha protetora você vai lá e arranca ela, deixando a ferida exposta. Depois da agressão invisto meu tempo em cuidá-la, tentando fazê-la regenerar a qualquer custo. E então quando estou quase perto de ficar curado você se aproxima e – não sei porque razão – arranca novamente a casquinha. E outra vez. Sempre assim, me agredindo e impedindo que eu fique curado por completo. No começo eu sentia muita dor diante de cada investida sua; aos poucos, porém, a dor foi cedendo lugar a um desconforto que hoje se resume à indiferença.

Você me faz mal, me machuca, me causa dor. Não sei exatamente porquê você faz isso, do mesmo jeito que também não sei porquê não consigo sentir raiva de ti, queria ser capaz de te desprezar, te abandonar, te esquecer. Queria retribuir as inúmeras pisadas que você me dá. Mas eu te amo, sei que tu me amas também. Não consigo te fazer mal algum.

Apesar de te querer tanto bem eu não sou capaz de entender essa tua estranha forma de amar, é bastante difícil de lidar, é doloroso pra mim. Penso em me afastar de ti, mas algo dentro de mim diz que eu preciso estar ao teu lado, que eu preciso te ajudar de alguma forma. Mesmo que minha ajuda não pareça surtir muito efeito prático.

Gostaria de saber como faço pra me livrar desse sentimento ambíguo que nos une. Todos os dias eu penso numa forma de tornar 'isso tudo' saudável, fazer de um jeito que não nos cause sofrimento. Eu não sei lidar com tal situação, mesmo depois de tantos anos de convivência ainda não aprendi. Talvez um dia eu consiga. Ou talvez eu canse no meio do caminho.

[Mente Hiperativa]

domingo, 3 de fevereiro de 2013

Tempo de Carnaval



Tempo de Carnaval

Carnaval é isso, é começar a semana resfriado e acabar com mononucleose, conjuntivite, torcicolo, virose e pé torcido. Subindo e descendo as ladeiras de Olinda nem percebemos que algum meliante sorrateiramente levou nossa carteira, não sentimos o calor pra mais de 40 graus, tampouco nos importamos com o cheiro forte de xixi que toma conta das calçadas. Os banheiros químicos sempre são poucos diante da falta de educação dos foliões.

E no caminho da alegria, entre um bloco e outro que passa pelas ruas, sofremos com as pisadas no pé, gastamos com litros e litros de cerveja, táxi e fantasias. Também dormimos poucas horas, nos cansamos muito, mas na manhã seguinte milagrosamente estamos em ótimas condições pra encarar mais um dia de festa. Seguimos adiante na folia, pulando, alegres, cantando, sem nos importarmos com os incontáveis decibéis que penetram no nosso ouvido. Tudo é bom no carnaval e até mesmo o que poderia soar como tortura, é na verdade o paraíso pra muita gente.

Esperamos o ano todo por esses cinco dias que na verdade se estendem por um tempo bem maior que isso, curtimos desde as ‘prévias’ até as ‘ressacas’ e queremos que o carnaval não acabe nunca. Mas ele acaba. E então ficamos tristes, pois queríamos viver um carnaval sem fim, o ano todo ou pelo menos um mês; o cansaço, entretanto, nos convence de que foi melhor assim. Por fim, voltamos à nossa rotina de trabalho e estudo, poucas noitadas, noticiário repleto de tragédia e muito descanso aos domingos, afinal de contas o corre-corre da semana é muito cansativo, né?

[Mente Hiperativa]