segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Habeas corpus


Habeas corpus

Um dia fui criança
Era feliz e nem sabia
A vida, eterna dança
Eu só pulava e corria

Brincava no parque
Me banhava no rio
Fazia muita arte
Meu mundo infantil

Hoje eu sou adulto
Me cobram seriedade
A alegria é um indulto
Nessa dura realidade

[Mente Hiperativa]

domingo, 30 de outubro de 2011

Ericksoniana-mente-hiperativa


Ericksoniana-mente-hiperativa

Postagem conjunta entre eu e Camila.

A vida virtual é tão versátil quanto qualquer outra vida, pois também lhe dá a opção de fazer o que quiser com ela. Você pode se afastar das pessoas ou se aproximar delas; pode se esconder ou se mostrar para o mundo; pode usá-la para “não fazer nada” ou criar alguma coisa interessante; pode ser quem é ou, ousadamente, buscar ser quem deseja ser...

De uma conversa entre duas pessoas que jamais se viram pessoalmente é possível nascer um “bebê”? Trocando idéias sobre nossos blogs, eu e Camila, do ‘Ericksonianamente’, nos perguntamos por que boa parte das pessoas que lêem nossas postagens não comentam sobre elas.

E tivemos uma boa idéia: perguntar pra vocês!

Sendo assim aqui estamos, apresentando o nosso bebê recém-nascido, desejando que ele cresça e aprenda muito com todos vocês. Para isso, precisamos entender um pouco do que se passa na sua cabeça...

No começo não foi fácil lidar com esta idéia, pois um bebê não tem futuro definido, não vem com manual, ele vai se definindo pela própria existência. Mas nossa criação foi fruto da sintonia, da sincronia, pois seus pais não acreditam em coincidências e sabem que a vida naturalmente nos move de encontro aos semelhantes.

Esperamos que vocês, queridos leitores, ensinem com carinho esse bebê, comentando sobre seus ausentes comentários, para que ele possa crescer e aprender um pouco mais sobre esse mundinho em que ele se inseriu... :)

[Mente Hiperativa]

sábado, 29 de outubro de 2011

O que é a vida?


O que é a vida?

A vida é crua
E cruel
É uma tripa de metal
Será que enferruja?

A vida não cansa
Mas dói
E a dor esgota
Será que castiga?

A vida é dura
Como a língua
Não tem cãimbra
Faminta, sedenta?

A vida
Sim, a vida
É líquida, é sólida
É plástica, a vida?

[Mente Hiperativa]

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

TOC


TOC

Acordou-se ao som dos despertadores, três deles, todos no mesmo horário. Levantou-se com o pé direito e foi ao toalete, com cuidado pra não pisar nas linhas do chão. Lavou as mãos e olhou-se no espelho, ajeitando os cabelos assanhados, escovou os dentes e ao fim da escovação alinhou a escova com o creme dental, com o fio dental e com a escova de cabelo, tudo paralelo. Lavou as mãos de novo.

Ainda de pijama sentou-se à mesa na cozinha, talher de um lado, copo na frente, com estampa virada, guardanapo dobrado, milimetricamente ao meio. Suco só de laranja, ou maracujá, pois são amarelos. Manga também podia ser, mas nunca acerola, uva, ou qualquer suco de outra cor.

Terminado o café da manhã, colocou a louça suja na pia, mas não de um jeito qualquer, pratos maiores embaixo, menores em cima, copos enfileirados, talheres paralelamente arranjados. E depois de toda essa arrumação, lavou novamente as mãos. A cozinha era toda ornamentada de verde, tampas dos potes, bainha dos panos de prato, utensílios quaisquer, verde, sempre verde. E nada noutra cor.

Correu até o quarto, em passos pares e aboletou-se na cama, com cuidado pra não desforrar o lençol estampado. Partiu para o ritual de espera, pois o dia só deveria começar às nove da manhã em ponto. E ainda era oito e quarenta e oito. Estava ansiosa pra lavar as mãos, mas precisava permanecer ali parada, estática, pois senão o dia não daria certo e alguma tragédia terrível poderia acontecer.

Era assim que ela exercia seu poder sobre os acontecimentos do dia. Ou pelo menos acreditava nisso.

[Mente Hiperativa]

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Misturas


Misturas

Desde garoto sempre gostou de misturar, misturava cores, sabores, verde com vermelho, doce com salgado, amarelo com amargo. Misturava música e leitura, romance e rock, sexo e carinho, números e prazer, goiabada e queijo prato, cerveja e calor. Sentia atração por traços orientais com cabelos ruivos, negritude e olhos verdes, pele clara e lábios grossos, sempre misturado, quase nunca puro.

Quando ia à praia notava que esta se misturava com as páginas de um livro, talvez revolucionário como os poemas de Maiakovski, ou musical como os versos de Cruz e Sousa. Os lençóis de areia, à noite, se confundiam com seu corpo suado, misturado com outro corpo de pele macia. Mas não misturava pecado e culpa.

Fechava os olhos e era capaz de sentir o cheiro verde do campo, enquanto o cinza da poluição urbana mimetizava o concreto de seus pensamentos igualmente sólidos. O canto aveludado das aves voava até seus ouvidos, e sentia falta, e sentia saudade, sentia também o cheiro cítrico das sabiás-laranjeiras pousadas nas árvores: mangueiras, abacateiros e mamoeiros.

Mais tarde aprendeu a mistura dor com prazer, vingança com perdão, e a morte inevitavelmente passou a permear a vida, as perdas misturaram-se com os ganhos e as derrotas com os bônus. Mas nunca compreendeu o sentido e a razão da morte.

Da sua janela vinha um tom musical que se confundia com uma fragrância aguda, sentia-a acariciando sua pele, reverberando pela noite fria e escura. O passado, como um presente, se confundia com o possível futuro. Talvez isso fosse grave, ou seu estado fosse grave, mas tudo lhe parecia assim, uma eterna mistura.

E de tanto misturar já não distinguia o que era belo e o que era Mozart, não separava o sofrimento do merecimento, o amor da agonia, a culpa da solidão, o sorriso amarelado do fracasso do olhar dourado da vitória, o medo de errar da sorte de vencer. Verdades picantes se confundiam com mentiras agridoces.

E o tempo jamais lhe trouxe o benefício da maturidade, continuou a misturar, a paixão e o sofrimento, a dor e o poema, a loucura e a razão, o amor e a prisão. A realidade misturada à imaginação.

[Mente Hiperativa]

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Eu não quero te querer


Eu não quero te querer

Eu não quero te querer. E naquele sábado de sol você me abandonou falando sozinho, com o copo de cerveja na mão, e foi embora, me deixando com a cara de bobo que eu tenho mas não gosto de usar. E antes disso, duas semanas antes, eu te deixei pra sempre, lembra que eu disse que ia te apagar da minha vida?

Você que não aceitou e veio atrás de mim novamente.

Não quero parecer bobo, apesar de saber que eu sou, não quero te querer novamente, e minha cara de bobo pretendo esconder do mundo. Talvez eu encontre outra faceta mais interessante no meu arsenal, posso usá-la quem sabe numa sexta-feira à noite, ou num sábado. Eu posso sair pra caçar em alguma boate movimentada ou em no mais novo boteco da cidade, recém-inaugurado... Ok, nós dois sabemos que eu não faço o tipo de quem sai à caça. Mas mesmo assim, prefiro não te querer mais.

Então se você foi embora, se resolveu me deixar com cara de bobo e copo de cerveja na mão, peço que não volte nunca mais. Eu vou tratar de mandar embora a cara de bobo junto com o copo pra um lugar bem longe. E espero que vocês três se encontrem e não voltem mais para atanazar a minha vida.

Eu não queria que fosse assim, mas você me obriga a não te querer, eu não te quero mais... Até que você resolva me querer. E quando voltar, por favor, traga a cerveja (e a cara de bobo). Obrigado.

[Mente Hiperativa]

terça-feira, 25 de outubro de 2011

Famílias terrivelmente felizes


Famílias terrivelmente felizes
Postagem sobre o livro de mesmo nome.

A capa desse livro me chamou a atenção diante de tantos livros na livraria, não somente por ser vermelha, mas pela ilustração assim indefinida, assim inexpressiva. Seria um verme? Uma tripa retorcida? O que danado é isso? - eu pensei. Até agora eu não tenho certeza do que seja, mas mexeu comigo, revirou muita coisa aqui dentro do estômago e coração, assim como fizeram os contos que o livro traz. O título também achei uma grande idéia, me soou sarcástico aos ouvidos, quando li imaginei logo que ele estava disposto a contar todos os segredos e incômodos que as famílias 'aparentemente felizes' escondem debaixo do tapete.

Confesso que a capa pitoresca foi o que me atraiu à princípio, mas logo folheei o livro e encarei as ilustrações disformes, indefinidas, mas cheias de sentido que, só mais tarde ao ler boa parte do livro, pude perceber como dialogavam tão bem com a natureza dos contos. São figuras de vermes, ratos mortos, telhados, penas e asas e tantas coisas mais que eu não sei ainda o que significam. São figuras encaradas como nojentas, sujas, imundas, diria até repugnantes. E o livro trata de assuntos assim, tristes, lamentáveis, trágicos, não espere ler um conto de fadas, não são histórias de príncipes e princesas encantados com finais felizes. É a realidade.

Mas ao contrário da impressão - errônea - que posso ter causado no parágrafo anterior, as histórias do livro não carregam uma áurea pesada, não são fatalistas ou tenebrosas, muito ao contrário, e é esse o diferencial do autor: ele consegue tornar o "feio" atrativo. O Marçal consegue tornar interessante fatos simples e aparentemente repulsivos, como um casamento desgastado, desencontros amorosos, assassinatos, brigas e fracassos em geral.

A realidade que ele se propõe a tratar é suja e imperfeita, mas é real, e ele conta com uma imensa riqueza de detalhes, harmoniosamente arranjados de modo que os contos se tornam leves e fluem suavemente apesar dos assuntos serem de difícil digestão. Além do mais as histórias são sempre surpreendentes, fugindo do lugar-comum dos romances e personagens estereotipados, expondo a realidade dura de uma forma suportável. O Marçal Aquino nos faz rir do que não tem graça, mas não é um riso de alegria, é de conforto à alma.

No primeiro conto, por exemplo, ele trata da morte de um homem que viveu a vida enclausurado num hospício. Isso por si só já é triste e depressivo, mas pela forma que ele conta, pelo ângulo que ele vê, se torna bastante interessante; ele resolve contar em terceira pessoa a vida que poderia ter sido e não foi. E quem nunca se perguntou a vida que poderia ter tido e não teve?

Assim é 'famílias terrivelmente felizes', é uma leitura agradável sobre o desagradável, é tão divertido que por hora esqueçemos que o conto é trágico, pois ele se torna belo e tão palpável que é digno de aplausos, e jamais de lágrimas.

[Mente Hiperativa]

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Eu matei o amor – relatos de um assassino


Eu matei o amor – relatos de um assassino

Sempre achei que amar fosse a maior de todas as loucuras do ser humano. Tentei me manter ‘normal’ e lutei contra essa loucura por bastante tempo, até que me aceitei louco, e nunca mais tive paz na vida.

Conheci o amor aos vinte e um anos, antes disso ele não existia nem nos meus sonhos, nem nos meus pais. Encontrei-o numa livraria grande da cidade, e depois de comer tapioca no alto da Sé e conversar bastante com ele eu senti o primeiro frio na barriga. Primeiro de toda a vida.

No dia seguinte eu senti medo. E era apenas o começo. Tive medo de ser abandonado, medo de expor minhas fraquezas, medo de ser apunhalado pelas costas, tantos medos eu senti, mas não foram suficientes para me fazer desistir do amor. E diferente do que eu esperava, ele foi bastante bonzinho comigo nesse primeiro contato, realmente não tenho do que reclamar.

No começo foi tudo bem, mas logo – e eu disse: logo – o amor me deixou bastante confuso, sem saber o que fazer, pois eu não tinha referências de amor, esse sentimento era pra mim um completo desconhecido e eu não sabia como lidar com ele. Eu tinha certeza de tê-lo encontrado, mas não soube o que fazer, como agir, o que pensar.

Não durou muito até que eu o matei.

Claro que me senti mal depois, era a primeira vez que eu o matava, senti sua falta nos meses seguintes, me arrependi do que fiz, mas já era tarde, ele havia morrido. Passei muito tempo cultuando aquele amor-defunto até que um dia, depois de muito sofrer, tive a idéia nada original de jamais me apaixonar novamente. E não é imprevisível dizer que pouco depois eu trai minha promessa, e voltei a me apaixonar.

Mas que fique bem claro, os outros amores nunca foram como o primeiro.

Eu passei a procurar em diversos rostos e corpos aquele amor que havia matado, vivi outros tantos amores (ou pseudo-amores), todos me machucaram e me deixaram confuso, todos eu acabei matando. No fim eu me encontrava com a alma calejada pelos amores vividos, cheio de pedras no sapato, afiadas, e o coração esquartejado. O amor também me fez suar frio, me deixou ansioso, triste, deprimido e, quem diria, até feliz. Mas esse último ocorreu apenas na minoria das vezes, e por um curto espaço de tempo.

Por esses motivos, e tantos outros que não cabem aqui, eu resolvi matar o amor dentro de mim, tornei-me um assassino em série. Passei a exterminá-lo friamente diante do menor perigo, qualquer passo em falso e eu sou capaz de dar um tiro na sua testa. E não sofro mais no dia seguinte, afinal isso é coisa pra iniciante, já sou profissional.

Mas apesar de eu ser um réu confesso, quero que fique bem claro que não tenho essa prática como um hobbie, não me dá prazer assassinar pobres amores incipientes e nem faço isso pra saciar qualquer desejo mórbido, faço porque não vejo outro caminho. Eu queria que o amor fosse pra mim uma companhia agradável, que me fizesse bem, mas ele me agride e eu não sei me defender de sua agressão de outra forma que não seja acabando com ele.

Acho que não aprendi a amar, não aprendi a ser amado.

O amor me obriga a matá-lo dentro de mim. E quando tento matá-lo sinto uma dor no peito que me lembra: ele é uma parte de mim. Ou seja, ao matá-lo eu mato um pouco de mim também, e justamente por isso eu sofro bastante.

Um dia, cansado de sofrer e de matar, eu tentei fazer do amor um sentimento tolerável, torneio-o platônico. Mas foi bobagem minha, pois logo descobri que até mesmo amores platônicos nos fazem sofrer. E como fazem... Fui ingênuo ao pensar que alimentando o amor diariamente, com boas doses de fantasia, ele se manteria nos confins da minha mente, quietinho, sem me incomodar, e quem sabe num dia distante se tornaria real e saudável. Mas esse dia nunca chegou, e ele acabou me ferindo como todo os outros amores "não-platônicos".

Foram muitos amores. Matei diversas vezes. E ressuscitei tantas outras.

Hoje eu cansei de amar, cansei de ser um assassino também. Por isso decidi que não vou mais matar o amor, apenas vou colocar uma pedra enorme e pesada em cima dele. E deixar que o tempo execute o resto do trabalho sujo. Eu desisto do amor, e nada me tira da cabeça que esse sentimento antes de tudo é masoquista, dói, e mesmo assim ainda insistimos em cultivá-lo.

[Mente Hiperativa]

domingo, 23 de outubro de 2011

SATURNO


SATURNO

Eu ouvi dizer que em saturno é sempre dia, e que não há escuridão, nem dor, nem tristeza. Lá as pessoas são simpáticas, felizes, elas são gentis com os recém-chegados e por lá ainda não se inventaram a bomba atômica, a gordura trans, nem a violência ou a guerra.

Em saturno as pessoas trocariam palavras cordiais, se fosse necessário falar. É que lá o pensamento é a forma de comunicação, são mensagens telepáticas que carregam não só um significado, mas também um sentimento. Não há barreiras em saturno, nem segredos, todos os pensamentos são compartilhados, tudo é de todo mundo. E ninguém se importa com isso.

Penso que se eu estivesse em saturno agora eu poderia andar descalço, e pisar no chão macio de saturno. Não sei de que ele é feito, só sei que não fere os pés, e não é de grama, nem areia, é de um material que só mesmo em saturno se encontra. Lá eu não precisaria de tênis, meias, nem nada disso. Não sentiria frio, nem faria calos. O chão de saturno é sem-igual.

E se eu sentisse fome poderia fechar os olhos e pensar nas delícias que a minha vó me fazia, como o pensamento é a comunicação logo ela me traria tudo que um bom neto gosta. E ela viria de onde estivesse, pois em saturno não há barreiras nem limites. E eu mataria minhas eternas saudades.

Em saturno as pessoas não morrem de fome, nem de desgosto, nem de câncer. Lá as pessoas não morrem, pois não há vida, há uma forma de existir tão ímpar que nós não temos palavras para designá-la. As pessoas existem, mas não vivem nem morrem, compartilham a existência, as experiências, os pensamentos, invadem uns os outros, e se confundem, se misturam, sem jamais perderem a identidade.

Eu tentei medir a distância daqui pra saturno, mas não há como, não há meios, nem aparelhos, tudo se perde em saturno, tudo ganha um novo arranjo, e as réguas passam a ser linhas, que se enroscam, e as linhas entram na mente e amarram idéias, que voam de volta à minha cabeça.

Saturno é assim, uma mistura de essências, que de tanto eu tentar entender eu aprendi que preciso sentir. Sentir, fechar os olhos e deixar saturno tomar conta de mim, não preciso publicar trabalhos científicos sobre saturno, nem tentar explicá-lo cartesianamente. Eu não conseguiria, ninguém conseguiria. Saturno foi feito pra se sentir!

Às vezes eu passo a noite conversando com saturno, gostaria de ir lá conhecê-lo pessoalmente, queria poder sentir meus pés descalços naquele chão macio que só em saturno se observa. Queria poder existir sem viver nem morrer, sem saber nem o porquê nem o nome de como é ser assim. Queria poder confundir e explicar o que não entendo e me animar a aprender o que talvez jamais poderei conhecer. Só queria ser... Em saturno.

[Mente Hiperativa]

sábado, 22 de outubro de 2011

No meu sofá velho cor de mostarda


No meu sofá velho cor de mostarda

Hoje eu decidi acreditar em destino, somente hoje. Eu que nunca botei fé nessa história, mas hoje resolvi lhe dar uma chance de provar sua veracidade, vou deixar as coisas acontecerem, vou andar sem escolher caminhos, sem me preocupar com nada, vou deixar que o destino me carregue pelos braços.

Sinceramente não sei nem onde vou parar, talvez no alto do pódio ou num beco repleto de bandidos drogados. Mas é só um dia, só pra atestar que o destino (realmente) não existe. Eu que nunca acreditei em destino, hoje resolvi lhe dar uma chance, mas ele não me levou a lugar algum, permaneci no sofá o dia todo.

Que planos o "destino" terá pra mim? Será que debaixo do sofá há uma passagem secreta que não fui capaz de descobrir? Ou ela não foi capaz de me absorver e me levar em direção aos meus desígnios?

Será que meu destino é vegetar num sofá velho e rabugento cor de mostarda? Que destino mais infeliz... Será que esqueceram de escrever meu destino? Ou o sujeito era analfabeto? Pode desenhar, se for o caso, eu aceito, pode ser uma bela paisagem bucólica, um lago, uma floresta, ou quem sabe um arranha-céu no meio do deserto. Desde que seja com vista para o oásis mais próximo eu não me queixo. Afinal não é só de secura que vive um deserto.

E não é só de esperar que vive o destino. Se eu ficar nesse sofá esperando o destino me levar a algum lugar no máximo vou conseguir uma dor de coluna.

O dia acabou, e a chance do destino me provar que existe também acabou. Agora retornar aos meus planos, minhas metas, vou usar meu livre-arbítrio que é o melhor que posso fazer. E se destino for tudo o que eu conquistar com meu suor e empenho, que seja bem-vindo o 'destino' então. Porque de esperar ele não me trouxe nada.

[Mente Hiperativa]

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Desilusão


Desilusão

Podia ter pulado do alto de um prédio, podia ter tomado muitos comprimidos coloridos ou até veneno de rato, teve medo de cortar os pulsos, pois não suportava ver sangue. Na cidade não havia trem pra se deitar sobre os trilhos, de tão pequena tinha poucos carros, sem avenidas largas e movimentadas para que pudesse provocar seu atropelamento. Queria achar um rio e uma pedra bem grande pra amarrar ao próprio pé.

Não pôde alcançar as cercas de alta tensão, tão bem protegidas por grades e cadeados, nem soube onde encontrar uma aranha minúscula, porém detentora de um veneno mortal, tubarões assassinos, leões ferozes, ou qualquer outro animal tão agressivo quanto um desses, tão colérico a ponto de atacá-la e fazê-la em mil pedaços, de preferência pedaços sem vida.

Queria ter encontrado algum malfeitor pelo caminho, munido de um cano pesado ou barra de ferro, quem sabe uma madeira com pregos, e repleto de fúria nos olhos. Mas não o encontrou naquela noite fria e escura. Se por acaso houvesse uma forca na praça da cidade, certamente ela teria usado. Se pertencesse a outro tempo teria se entregue à santa inquisição dizendo-se feiticeira.

Mas nada disso aconteceu, não encontrou nenhuma maneira eficaz de acabar com o sofrimento que ardia rasgando-lhe o peito, teria que aprender a suportá-lo mesmo à contra-gosto. Tivera sua primeira decepção amorosa, aos 14 anos, mas pra ela era uma dor merecível de morte. Não sabia ainda que era só o começo, e que tantas e tantas outras paixões ainda lhe trariam sofrimento na vida.

E continuaria com medo de sangue.
[Mente Hiperativa]

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Isso também vai passar


Isso também vai passar

Não tenho nenhuma tatuagem, mas não tenho nada contra quem tem, e nem penso que um desenho na pele seja capaz de mudar a fé ou alterar o caráter da pessoa. Que pensamento mais retrógrado... Descartando certos exageros e absurdos, algumas pessoas até que ficam bem com uma tatuagem.

Eu até já pensei em fazer uma, mas nunca encontrei algo realmente representativo a ponto de marcar meu corpo pra sempre, precisaria ser algo importante pra mim como o nome de um filho ou uma mensagem importante. Sempre achei tão banal tatuar um dragão enorme, uma serpente ou sei lá, um ideograma chinês. Há pessoas que ficam bonitas, charmosas, mas eu certamente enjoaria rapidamente daquele desenho se não tivesse algum propósito de estar ali.

Foi então que recebi um email com a mensagem entitulada pro: "Isso também vai passar". Daria uma boa tatuagem, pensei de imediato.

"Isso também vai passar", poxa, me pareceu tão digna de se carregar todos os dias, de se ler todos os dias no próprio corpo, na própria pele, como um lema, uma ideologia, mais que isso, um Alerta!

Pensei que eu poderia acordar um dia de ressaca, depois de uma imensa decepção amorosa e ler essa mensagem tatuada em mim, seria um conforto. Ou depois de perder um ente querido, olhar-me no espelho e me deparar com essas quatro palavras.

E, por outro lado, num momento de bastante alegria e euforia, a tatuagem ia me lembrar de que as coisas boas também passam, dinheiro, fama, status, riqueza, conquistas, tudo isso passa e eu também seria lembrado que é preciso ser humilde diante da vitória.

"Isso também vai passar", afinal os grandes amores e dores passam, e tudo mais passa. É uma sábia filosofia, daria uma boa tatuagem.

[Mente Hiperativa]

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

O que realmente importa?


O que realmente importa?

A menina entrou no ônibus e logo se acomodou num banco, queria sentar ao lado da janela, mas não tinha nenhum banco desse tipo vazio, então ficou no lado do corredor mesmo. O ônibus seguiu a viagem, sacolejando.

Ela tinha apenas seis anos, seus cabelos eram cacheados, loiros, e foram gentilmente presos dos dois lados da cabeça. Tinha ainda uma boca miúda, além de um par de olhos azuis enormes e bastante expressivos. Era linda, e por isso chamava a atenção.

Na mesma hora em que ela se sentou, o rapaz que estava noutro banco lendo um livro qualquer de capa vermelha desviou o olhar para ver aquela menina, que para sua surpresa estava encarando-o com seus olhos azuis enormes. Mas ela estava apenas curiosa pra saber que história ele lia, tão entretido, naquele livro.

Do outro lado havia uma moça bastante elegante e bonita que também observou a menina entrar no ônibus e não tirou mais o olhar sobre aquela loirinha. Ela sempre sonhou em ter uma filha e naquele momento imaginou que ela poderia ser tão linda quanto aquela menina que via ali quietinha sentada no ônibus, mais parecia uma boneca. E o ônibus seguiu seu rumo, chacoalhando.

A menina ficou atenta para o caso de esvaziar um lugar junto à janela, mas quando alguém se levantava logo outra pessoa ocupava o lugar da janela, sem que ela tivesse a menor chance de consegui-lo. Ela acabou se resignando a permanecer junto ao corredor.

Uma velhinha tão frágil se encantou com a menina, teria até acenado pra ela se tivesse força para fazê-lo, mas sorriu, um sorriso igualmente frágil. Um pedinte que passava pelo corredor pedindo moedas teve medo dos seus olhos tão azuis, nunca tinha visto dessa cor assim tão de perto e pensava até que não eram olhos de verdade. Quando se deu conta do ronco do motor o pedinte apressou o passo pra descer antes que o ônibus continuasse a viagem, sacudindo.

E as outras pessoas que subiam ao ônibus logo se deparavam com aquela menina tão formosa, de cabelos cacheados, loiros, boca miúda e olhos azuis enormes. Ela também observava a todos, com receio e timidez.

O ônibus andava veloz, o motorista parecia olhar a menina pelo retrovisor, e sua boca miúda, ele tinha pressa de entregá-la em casa, e dobrava à esquerda, à direita, freava, seguia, num caminho conturbado, balançando o veículo para um lado e para o outro.

Eis que num dado momento os olhos azuis enormes da bela menina olharam para o rapaz que lia um livro qualquer da capa vermelha, ele estava concentrado na história que parecia interessante. A moça elegante e bonita falava ao telefone, com entusiasmo, talvez com o namorado ou marido. A velhinha frágil cochilava, e as outras pessoas ouviam música, conversavam ou somente se distraiam observando a paisagem pela janela.

E quando seus olhos curiosos constataram que ninguém estava a observando ela repentinamente abriu a boca miúda, inclinou-se pra frente segurando com firmeza pra não cair e vomitou. Seu vômito era bastante espesso, de cor salmão e rapidamente escorreu pelo chão do ônibus atingindo boa parte do corredor. E quando parecia ter acabado, veio mais um jato, e outro.

Logo em seguida ela se acomodou novamente no banco com seus olhos enormes, mas agora nada curiosos, e sim, apreensivos. E pouco importava nesse momento se eram azuis, castanhos ou pretos.

Então todos olharam para aquela menina, outrora tão encantadora, mas agora capaz de lhes causar um enorme asco. Todos observavam seu vômito de cor salmão no corredor do ônibus, escorrendo, sujo, e seus olhares seguiam com nojo o vômito até chegar à boca miúda da menina, que permanecia apática.

O rapaz que lia um livro qualquer da capa vermelha logo o fechou - como quem perdia o prazer de continuar a leitura - e o guardou na mochila. A moça elegante e bonita despachou o namorado ou marido ao telefone, encerrando a ligação com um breve “até mais tarde”; e levantou-se depressa de onde estava pra seguir até o fundo do ônibus e fugir daquele terrível cheiro de vômito.

A senhora frágil, que sequer conseguira acenar para a menina, acordou-se por conta do burburinho que permeava o ônibus naquele momento. Ela demorou a entender o que as pessoas falavam baixinho, cochichando, e esboçou uma careta ao ver que o vômito havia salpicado na barra da sua saia e no seu pé. Olhou para a menina, mas teve pena de condená-la.

Os olhos azuis enormes da garota percorriam timidamente os bancos e percebiam as pessoas se levantando e indo embora, se afastando dela, como se tivessem subitamente perdido todo o encanto de seus olhos expressivos e longas madeixas loiras cacheadas que escorriam dos dois cantos da cabeça. Agora as pessoas sentiam nojo dela.

O motorista encarou a menina pelo retrovisor, dessa vez viu não somente a boca miúda, mas também os olhos azuis enormes. E lamentou não ter conseguido chegar logo na casa da menina da boca miúda, que de encantadora tornou-se horrenda.

Nota: Muitas vezes certas coisas tão banais nos atraem a atenção. E tantas outras igualmente banais nos causam um desencanto completamente desnecessário e evitável. E no fim das contas, o que realmente importa?

Como diria o pequeno príncipe "Só se escuta bem com o coração, o essencial é invisível aos olhos".

[Mente Hiperativa]

terça-feira, 18 de outubro de 2011

Mulheres são de Vênus


Mulheres são de Vênus

Mulheres são de Vênus, o amor também, a beleza e tudo mais que há de singelo e puro. Mas as mulheres não são somente pureza, são também sedução e dissimulação, e isso eu não sei se vem de Vênus ou de onde vem.

Só sei que as mulheres são capazes de tudo, são loucas e amáveis, cativantes e castradoras, tudo a seu tempo, ou tudo fora de tempo. São capazes de tudo! E você nunca vai entender com clareza o que se passa na cabeça dela; receio que nem elas mesmas se entendam.

Talvez em Vênus seja normal brigar de manhã cedo, arrumando uma inimiga mortal, e logo mais à tardinha descobrir uma afinidade que as transforma em melhores amiga de infância. Falsidade ou intuição? Nunca saberemos, nós homens. Talvez por lá seja comum aqueles ataques, aquelas cismas desmotivadas e sobretudo aquela intuição que (quase) nunca é à favor do homem.

Mulher é assim, cria inimizade sem-motivo ou simpatia sem ter porquê, de graça; tem sexto sentido; tem o coração de mãe, que só mãe tem e sabe como é. Mulher sente a dor que homem nenhum sente, e não falo aqui de dor do parto, essa é a menor que ela passa na vida com um filho, falo de dores maiores, espirituais, emocionais, que não se sente na carne.

E homem nenhum entende isso, e não é por maldade ou falta de esforço em entender, é somente porque não ocorre dessa forma no nosso universo, não faz parte da gente e por isso fica uma eterna interrogação que na maioria das vezes fugimos ou ignoramos. Não há como entender o ininteligível.

Mas as mulheres não foram feitas para serem compreendidas, e sim amadas. Elas nos compreendem, ou usam da dissimulação para que acreditamos que sim, afinal como já disse elas são capazes de tudo... Ah, mas que bobagem isso, são tão amáveis que acabamos cedendo aos seus caprichos e a amamos de uma forma ou de outra.

E por isso tenho certeza, o amor, seguramente, é de Vênus.

[Mente Hiperativa]

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Whisky


Whisky

Foi uma paixão avassaladora, selvagem, do tipo que só se vê numa mega produção hollywoodiana. Ele era um jovem milionário e nunca havia sentido aquilo, um amor tão forte como aquele. À princípio todos foram contra sua história, mas ele abandonou tudo por aquela mulher, se intrigou da família, se afastou dos amigos, tudo por ela.

"Ela" era uma loira fenomenal que tinha apenas um metro e meio, mas dona de uma beleza e simpatia que logo conquistaram o coração daquele pobre e ingênuo rapaz. Namoraram dois meses e logo se casaram, três meses depois ela fugiu e lhe roubou toda a fortuna, deixando-o inconsolável e decepcionado.

Hoje ele afoga as mágoas num copo de whisky barato, talvez até falsificado, lembrando que os melhores perfumes vêm nos menores frascos. E os piores venenos também.

[Mente Hiperativa]

domingo, 16 de outubro de 2011

No meio do caminho tinha o amor


No meio do caminho tinha o amor

No meio do caminho tinha o amor. Eu andava rápido e quase tropecei nele. O amor no meio do caminho me fez cair e tombar no chão. Machuquei o joelho, doeu, mas o amor me ajudou a levantar, me deu o apoio e o carinho que eu precisava. Minhas feridas sararam rápido e deixaram cicatrizes que o amor não permite que eu veja, tudo parece tão bonito desde que encontrei-o no meu caminho. Às vezes me lembro de como andava apressado e desatento, quase não percebi o amor no meio do caminho, imagine se eu tivesse passado sem vê-lo. Será que cruzaria novamente o meu caminho? Ou jamais o encontraria?

Nunca vou saber. Só sei que no meio do caminho tinha o amor.

[Mente Hiperativa]

sábado, 15 de outubro de 2011

DESavanços de um mundo moderno


DESavanços de um mundo moderno

Tenho uma amiga que estuda ciências da computação e vive cantando pra mim as maravilhas da vida moderna, cibernética, além de todos os recursos que a tecnologia nos traz nesses tempos modernos. Certo dia ela me falou -como se isso fosse a melhor coisa do mundo- que não precisava sair de casa pra comprar nada, "faço tudo pela Internet". Confesso que hesitei em contrariá-la, eu ia ficar calado sem concordar nem discordar, mas logo ensaiei mentalmente em dizer o quão terrível isso me parecia.

Eu disse o que eu pensava a respeito das compras online, mas a verdade é que diante dela eu me sinto um daqueles fósseis recém-desenterrados do período triássico ou talvez um mamute congelado, perdido no tempo, cujo DNA remonta a era das cavernas.

Tentei convencê-la a enfrentar o mundo real, tentei arrancá-la daquele quarto frio e solitário, daquela cápsula na qual ela vive 24hs por dia atrás de uma tela led touch screen 32", mas nada do que eu disse a convenceu de abandonar seu computador e encarar o mundo inóspito lá fora. Depois que eu gastei meu latim ela me olhou com cara de desdém, riu, e disse simpaticamente que eu era muito louco.

Louco? Eu? Por sair de casa pra fazer compras? Louco não seria quem se esconde do mundo real?

Quem quiser que discorde de mim, mas eu não gosto de fazer compras pela internet, qual a graça de ter o mundo ao alcance de um toque? Acho tão curto o espaço percorrido pelo meu dedo, queria ter que usar as pernas, o corpo todo, me mexer, andar, suar... Por isso mesmo que eu gosto de fazer minhas compras na rua, gosto de ir ao centro da cidade e lá eu encontro todo o tipo de produto, tudo ao alcance do meu dedo, também.

Eu sei que a cidade faz calor, é desconfortável e anti-prático, mas eu tomo um banho antes de sair (cuja refrescância nem dura muito tempo) e calço um bom tênis e isso me ajuda a suportar essa empreitada. O sol incomoda, mas eu sigo pelas sombras das escassas árvores e marquises, e nas minhas compras reais eu posso pegar o produto, olhar, testar, analisar, coisa que (ainda) não se pode fazer na internet.

Mas tem coisa que nunca vamos poder fazer online, como enfrentar o empurra-empurra do comércio, ouvir vendedores gritando e anunciando suas promoções relâmpago, e o povo correndo, se aglomerando, às vezes até trocando cotoveladas para poder pegar o produto de melhor preço.

O melhor de tudo é chegar em casa cheio de sacolas e abrir as compras, que graça tem comprar e ficar esperando uma eternidade para que cheguem pelos correios? Quem aguenta esperar? Vivemos a era do imediatismo!

Eu não consigo me acostumar com tanta comodidade, compras online, sem sair de casa...

Outra coisa que eu nunca poderei fazer ao comprar pela internet é ver gente. Claro, quando saio na rua eu vejo gente, eu lido com gente, falo com gente, estabeleço relações, gosto de olhar os tipos humanos, observar seu comportamento. E na internet quem faz isso? No máximo você lida com um programa de computador. Só posso pensar que pessoas cybernéticas, que só fazem compras online e se recusam a sair para o mundo, tem medo de gente. Desconfio que eles nem abrem a porta de casa quando lhe batem. Devem ter fobia de gente. Que povo louco...

[Mente Hiperativa]