quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Sede de viver


Sede de viver

Há alguns dias (especificamente dia 28-09-11) eu estava saindo da universidade quando passei em frente ao maior prédio da UFPE, o CFCH (Centro de Filosofia e Ciências Humanas), vi uma multidão aglomerada no térreo, carros da polícia federal, faixas, e na mesma hora eu deduzi o que havia acontecido, me aproximei e logo constatei minha temível suspeita. Sim, era mais uma vida esmorecida que havia sido findada ali naquele prédio, mais um corpo se jogara lá de cima e, sem asas, se espatifava no chão.

Naquele dia eu tinha estudado a tarde toda, tinha acabado de jantar no restaurante universitário e estava indo pra casa, passei ali por acaso e vi uma moça coberta por um plástico, eu nem sabia o nome dela, nem tive tempo de conhecê-la, e ela agora jazia rodeada de curiosos. Na mesma hora o jantar embrulhou-me o estômago, e aquela moça embrulhou-me as idéias.

De primeira não pude deixar de julgá-la uma corajosa, sim, eu jamais conseguiria acabar com minha própria vida dessa forma. Eu sei que a vida nem sempre é fácil, a minha não foge à regra, mas mesmo nos momentos mais difíceis eu sequer pensei nessa saída tão impiedosa. Ainda mais assim, me jogando de uma janela de um prédio de 15 andares. Não, eu sou frouxo demais pra isso, prefiro a covardia de ficar vivo e cheio de problemas à coragem de acabar com tudo.

Depois eu pensei por que se matar assim, de uma forma tão expositiva, porque fazer um palco para a própria morte? Porque envolver, ainda que indiretaente, outras pessoas nisso. A morte em si já é tão cruel... Será possível que a vida dela fosse mais cruel até que a morte? Não posso acreditar nisso.

E quanto a esse prédio, porque tantas pessoas já se jogaram dele e nada de concreto foi feito pra que isso acabe? Que atmosfera ronda essa construção que impulsiona as pessoas a acabarem com a prórpia vida? Que facilidades encontram no CFCH?

Será mesmo que essas mortes são realmente suicídios? É sabido que lá ocorre também assaltos, tentativas de estupro, além de muitas pessoas -alunos ou não- utilizarem o espaço público como motel e intenso consumo de drogas, afinal são 15 andares, muitos deles pouquíssimos utilizados, escuros, OBscuros.

Quem é de Pernambuco certamente já ouviu falar do tal do CFCH e das pessoas que se jogam lá de cima, a reitoria abafa fortemente a imprensa, mas eu já tinha ouvido falar até antes de ingressar na universidade, achava que era boato ou lenda urbana, mas não é, é pura verdade. Eu sei que é um pouco indigesto falar sobre esse assunto, mas ele existe e pra quem está mais perto dele é um assunto que desperta muitos sentimentos, sobretudo o medo.

Muitos alunos do CFCH tem medo de estudar lá, medo de assalto, violência de todo tipo, e outros alunos tem medo de passar por esse prédio. Medo de serem jogados lá de cima (quem sabe o que se passa lá?), medo de alguém cair em cima de você enquanto se atravessa por ali, ou simplesmente medo de ver um corpo sem vida no chão.

Esta foi a quarta pessoa do ano que pulou do CFCH, quatro em nove meses, e o que está sendo feito pra evitar esse incidente? O que PODE ser feito?

Eu pensei nas famosas grades, havia um movimento pelas grades-no-CFCH, colocaram grade nos corredores de trás do prédio, mas ao que me parece não serviu de muita coisa. Além disso o prédio carece de segurança, mas vão colocar seguranças em cada janela? Isso é irreal. Li num blog a sugestão de implodir o prédio e construir um mais horizontalizado, achei uma medida muito radical, mas será preciso ser radical pra solucionar o problema? Ou há uma solução mais flexível? É preciso haver um controle de fluxo, câmeras ou o que?

Enquanto a gente pensa mais um sobe o elevador do CFCH em direção à janela...

Depois de passado o choque e o susto de ver aquela garota estendida no chão frio, eu comecei a pensar em mim, me senti um pouco egoísta, mas enfim, pensei em como minha vida é boa apesar dos pesares, agradeci a Deus por ela e jurei que nunca mais reclamaria dos meus problemas. Na verdade nem sei se vou conseguir cumprir a tal promessa, mas fiz, foi meu sentimento na hora.

Até achei um pouco de egoísmo da minha parte, mas quando vi aquela moça no chão o meu sentimento de pena não foi maior do que a minha sede de viver. Eu me senti vivo diante daquela cena. Fiquei triste por ela, mesmo sem conhecê-la, mas penso que nenhum problema seja merecível de morte, e nenhum será solucionado por ela; mas também me senti feliz, por mim, pela minha vida.

Na morte eu vi vida, vi minha vida.

[Mente Hiperativa]

Um comentário:

  1. "Enquanto a gente pensa mais um sobe o elevador do CFCH em direção à janela..."
    e o que nos resta são interrogações,
    foi terrível ver que essa lenda do cfch é real...

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