quarta-feira, 15 de maio de 2013

O mais belo produto do amor


O mais belo produto do amor

Primeiro percebeu uma sensação de incompletude mal explicada, acompanhada por uma inquietação sem razão aparente (ao mesmo tempo que parecia ter todas as razões do mundo pra se manifestar). Sentiu-se como um índio selvagem largado no meio da cidade insalubre de puro concreto e calor de 45ºC. Não fazia a menor ideia de onde deveria ir, apenas desfrutava o sabor do vácuo no universo infinito, como um grande satélite sem coragem ou impulso próprio pra seguir a um lado ou outro.

Assim manteve-se por um bom tempo, parada, imersa em elucubrações difusas sem saber exatamente onde iria chegar, mas disposta a descobrir a raiz de todo desconforto que lhe acometia. Tinha consciência de que ninguém poderia ajudá-la naquele momento, pois chegar à razão de suas angústias mais íntimas era tarefa que deveria ser feita na solidão de seus pensamentos. 

Ainda não compreendia o motivo de tamanho mal-estar, afinal vivia o auge da independência em sua vida, momento o qual jamais havia experimentado anteriormente. Por que sentir-se incompleta se agora tudo parecia tão perfeito como nunca antes? Apesar de tanta estabilidade e segurança, faltava-lhe alguma coisa que não sabia ainda o que era, apenas desejava ardentemente por algo que a tirasse da confortável posição de quem já concluiu todos os planos na vida. Queria um desafio capaz de preencher a lacuna que habitava sua alma e assim surgia uma necessidade que ainda se manteria desconhecida e enigmática por um bom tempo. 

As respostas a seus questionamentos vieram no momento certo, após o devido amadurecimento e preparo para recebê-las. Depois de refletir bastante foi que constatou que não poderia completar esse vazio por si só, precisaria da ajuda de outra pessoa para que esta lhe doasse um pedaço seu, o qual junto com um pedaço dela mesma enfim preencheria o vazio que ambos sentiam na alma. Assim, a necessidade foi cedendo lugar a um ardente desejo de encontrar a tal pessoa capaz de aliviar sua angústia, queria também proporcionar a outrem tal sensação de completude. Procurou, então, alguém que compartilhasse do seu desejo e que lhe despertasse no íntimo aquele desconforto típico de quem sabe que encontrou o amor. O estômago pareceu ser o primeiro a manifestar tal denúncia, seguido quase de imediato pelo coração que se acelerou ritmicamente, a pele ficou fria, o suor escorreu pelas mãos como torneiras abertas e por fim um calafrio percorreu a espinha como um sinal de confirmação: era essa pessoa que ela tanto buscou. 

O grande encontro enfim cristalizou a necessidade e desejo de perpetuar sua existência através da geração de outro ser. Esse seria formado por uma ínfima parte de cada um dos dois que juntas e mescladas tomariam vida própria e vontades alheias às vontades de seus genitores. A ínfima parte na verdade seria enorme, ela é tudo, é a percussora de toda a essência do novo ser, a matéria que fornece toda a origem de um organismo, sendo a energia geradora proveniente do contato entre as duas matrizes. O amor se encarrega de coordenar o processo.

Quando encontrou seu par ideal o qual compartilhava das mesmas convicções e vontades reconheceu que havia chegado a hora de perpetuar a própria existência. Então nas suas cabeças surgiram pensamentos que foram ganhando forma dia após dia, como se duas crianças moldassem na massa de modelar uma nova criatura; a modelagem, porém, não era apenas física, era até muito mais espiritual do que qualquer outra forma mais palpável de criação. 

E logo aqueles pensamentos cultivados com o passar dos dias, por muitos dias, foram se desprendendo do fundo de suas almas. Quando os dois corpos estavam juntos, unidos em um só, suas expectativas se juntavam e se misturavam em uma massa energética luminosa que parecia uma pequena estrela envolta por poeira cósmica dando origem ao verdadeiro fruto do amor. Assim, o rebento ia formando sua essência, tal qual carregaria daqui em diante por toda a vida, acrescentando posteriormente diversas características resultantes de suas escolhas e vivências particulares.

Após a concepção findou-se a inquietação inicial daquela mulher, e tantas outras sensações diversas ainda surgiriam em torno desse novo ser. Um cordão invisível passou a unir seus corpos de modo que os prenderia por toda a eternidade num laço indissolúvel de amor.

[Mente Hiperativa]

4 comentários:

Deixe sua opinião: